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Pesquisadora Tarsila Costa publica livro “Cartografia das imagens cristalinas em Gilles Deleuze: tendências e texturas” (2023)

Doutora em Filosofia pela UERJ na área de Estética e Filosofia da Arte, Mestre em Filosofia pela UERJ e Especialista em Arte e Filosofia pela PUC. | Foto: Arquivo Pessoal

 

Na obra, a pesquisadora se aprofunda nas permeabilidades entre a filosofia deleuziana e o conceito das imagens cristalinas que apresenta um entendimento do mundo e do tempo nas distintas constelações de pensamento que compõem o horizonte da Filosofia.

 

Em entrevista exclusiva à Editora Dialética, a autora e pesquisadora Tarsila Costa, cujo trabalho inovador conduz o leitor por uma jornada profunda nas camadas da filosofia do acontecimento de Gilles Deleuze, fala sobre seu mais recente livro: “Cartografia das imagens cristalinas em Gilles Deleuze: tendências e texturas”

Na obra, a pesquisadora se aprofunda nas permeabilidades entre a filosofia deleuziana e o conceito das imagens cristalinas que apresenta um entendimento do mundo e do tempo nas distintas constelações de pensamento que compõem o horizonte da Filosofia.

Ao longo desta entrevista, será possível entender as inspirações, desafios e descobertas que moldaram a obra de Tarsila Costa. Ela nos guiará pelas reflexões contidas nas páginas do seu livro, revelando como as tendências e texturas das imagens cristalinas se entrelaçam com os conceitos deleuzianos, desvelando ainda uma nova perspectiva na compreensão da experiência humana sobre o tempo em sua dimensão inorgânica.

Este livro é destinado a estudantes, acadêmicos e entusiastas da filosofia contemporânea, especialmente àqueles que buscam aprofundar sua compreensão das obras de Gilles Deleuze e sua aplicação a campos como Estética, Teoria da imagem e Metafísica.

 

Confira agora a entrevista de Tarsila Costa à Editora Dialética

 

1 – Como surgiu a inspiração para explorar o conceito de imagem-cristal em diferentes manifestações artísticas, como cinema, pintura e sistemas de minerais cristalinos, a partir da perspectiva de Gilles Deleuze?

R – Bem, o primeiro impulso vital para estudar os cristais de tempo em Deleuze foi o meu encontro com a pintura A ciranda (1907) de  Pellizza da Volpedo, digamos, que a partir dessa imagem houve um início de uma vontade para explorar a metafísica das imagens cristalinas em suas diversas tonalidades e singularidades afetivas, nessa imagem já havia um princípio de vida e morte, luz e sombra, memória e esquecimento que coexiste no tempo e compõe as imagens cristalinas em sua fundação. 

Não poderia deixar de falar da obra Cinema 2: a imagem-tempo de Gilles Deleuze como a base e o fundamento em termos da matéria de pensamento dessa pesquisa. 

Fazendo uma retrospectiva do processo dessa pesquisa, mais especificamente, no ano de 2013 quando ingressei na especialização de Arte e Filosofia da PUC-Rio, tive a honra de conhecer o Prof. Dr. James Bastos Arêas que ulteriormente tornou-se um grande amigo e orientador da minha pesquisa no Mestrado e Doutorado (PPGFIL-UERJ), o livro foi dedicado a ele (in memoriam) por toda amizade e aprendizado cultivado nos últimos anos.

 

2 – Qual foi o maior desafio ao realizar a cartografia das imagens cristalinas, considerando a interseção entre cinema, pintura e sistemas de minerais cristalinos? 

R – Acredito que tenha sido comprovar essa relação permeável de tendências e texturas entre os distintos planos cristalinos no cinema, pintura e nos sistemas de minerais cristalinos.

 

3 – Houve alguma descoberta inesperada durante o seu processo de pesquisa?

R – Sim, houve. Em razão do problema filosófico que envolve a imagem-tempo ser um problema estético e também metafísico, foi necessário explorar um campo de profundidade mais intenso, múltiplo e profundo do tempo. 

Descobri que além dessa classificação dos cristais de tempo feita por Deleuze, possivelmente, outros tipos de imagens cristalinas poderiam existir, tal como, indico uma nova possibilidade: o cristal aiônico (Aion, refere-se ao conceito grego de tempo, de acordo com Heráclito, seria a “duração da vida”, um tempo eterno) constituinte da “imagem-universo”. Desse modo, a intrínseca ligação entre a imagem-cristal e a “imagem-universo” também foi uma descoberta de uma camada e dimensão mais ampla nos cristais de tempo.

 

4 – Gilles Deleuze propõe diferentes categorias de cristais de tempo, como o cristal perfeito, cristal rachado, cristal germe e cristal em decomposição. Como essas categorias se refletem nas diversas manifestações artísticas exploradas no seu livro? 

R – Por meio de qualidades e tonalidades afetivas que as diferenciam e as singularizam visíveis em suas diferentes tendências e texturas nos planos cinematográficos, pictóricos e cristalográficos. Por exemplo, no cristal perfeito temos toda uma ideia de certa clausura visível em um cosmo finito, fechado e centrado, como podemos ver em Lola Montès (1955) de Max Ophüls, toda a narrativa centra-se no passado de Lola de Montès, ou também, em Carta de uma desconhecida (1948), igualmente de Ophüls. 

Podemos visualizar nesses filmes uma perfeição em termos de distribuição de luz e sombra que faz com que as imagens alcancem um brilho cristalino intenso, tal como um diamante que cintila em seu esplendor em sua tendência e textura especulares. Se formos para a próxima fase dos cristais de tempo, o que aparece é o cristal rachado, aqui toda aquela perfeição estética já foi fendida e uma maior intensidade de caos compõe as histórias e os personagens, tal como podemos ver no filme A regra do jogo (1939) de Jean Renoir, entre outros filmes desse grande diretor que revelam tendências e texturas aquosas nas instabilidades e fugas que qualificam o cristal rachado

Desse modo, cada imagem cristalina será composta de uma singularidade que abarca distintas tendências e texturas.

 

5 – Como a cartografia das imagens cristalinas contribui para uma compreensão mais ampla das relações estéticas entre cinema, pintura e sistemas de minerais cristalinos?

R- Acredito que através das distintas singularidades de cada cristal de tempo foi possível pensar essas permeabilidades qualitativas de tendências e texturas em distintos planos, e se tratando de uma cartografia, penso que por meio desse método foi possível compor um mapa afetivo que apresentasse essas relações de tendências e texturas nos diferentes planos cinematográficos, pictóricos e cristalográficos, o que tinha também como objetivo ampliar o modo pelo qual o plano em suas distintas expressões pode guardar relações e covariâncias em termos de uma lógica do sentido que cada imagem cristalina tem e suas ressonâncias qualitativas que nos mostram essas intercessões entre diferentes planos. Uma interessante questão da metodologia cartográfica é permitir relações interdisciplinares, o que acredito que possibilite uma compreensão mais horizontal e diversa referente ao problema das imagens cristalinas e da imagem-tempo que a atravessa em sua constituição.

 

6 – Você acredita que o conceito de imagem-cristal pode ser aplicado a outras formas de expressão artística além das exploradas no livro? Se sim, quais seriam essas formas e como você imaginaria essa aplicação?

R- Acredito que sim. Este livro apresentou minha pesquisa de Mestrado, no prosseguimento da pesquisa de Doutorado, os cristais de tempo também foram pensados na literatura. 

Considerando a distinção entre novelas e contos que Deleuze e Guattari apresentam no capítulo 8 do livro Mil platôs, v. 3 (Editora 34), em termos de temporalidades distintas que constituem esses estilos literários, nessa perspectiva, a novela, por exemplo, se voltaria para uma dimensão passada (o que aconteceu?), já o conto se direcionaria para o futuro (o que vai acontecer?). É fundamental observar que essa dimensão de passado-futuro é uma espécie de dobra temporal que em termos de forças e potências constituem os cristais de tempo, que além de apresentar um problema estético, também demonstra um problema físico e metafísico da imagem-tempo.

 

7 – Você espera que sua pesquisa e cartografia das imagens cristalinas possam influenciar ou inspirar futuros estudos no campo da Estética e da Filosofia da arte?

R- Espero que sim.

 

8 – O seu livro é acessível para leitores com diferentes níveis de conhecimento sobre o assunto?

R- Acredito que sim. O fato de Deleuze também pensar com as imagens no cinema, na pintura, entre outras formas artísticas, traz uma grande oportunidade para o público leitor de compreender alguns problemas filosóficos e visualizá-los por meio da Arte, Filosofia e Ciência. 

Aliás, o que me parece, é que o pensamento deleuziano quer nos encorajar a criar relações interdisciplinares para que nesse exercício de pensamento possamos perceber e compreender a vida e o mundo em sua multiplicidade e diferença, que nesse perspectivismo de imanência vejamos que há interessantes covariâncias e relações de sentido que formam o plano de composição da Arte em suas variedades artísticas, o plano de imanência da Filosofia em suas variações conceituais e o plano de referência da Ciência em suas variáveis científicas.

 

9 – Em termos de publicação do livro e questões editoriais, como foi a experiência de publicar sua pesquisa como livro? 

R- Foi ótima. Sinto-me muito feliz e realizada com a publicação do meu primeiro livro pela editora Dialética.

 

 

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